STF tem decisões conflitantes sobre reeleição em Assembleias estaduais

Na época, a decisão travou a recondução do deputado Rodrigo Maia (sem partido-RJ) e do senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) à presidência das respectivas Casas Legislativas

O STF (Supremo Tribunal Federal) mantém afastados de suas funções há praticamente um ano presidentes de duas Assembleias Legislativas ao mesmo tempo em que assegurou a outros o direito de prosseguir nos cargos.

A controvérsia é ainda consequência do julgamento que, no final de 2020, barrou a possibilidade de reeleição dentro de uma mesma legislatura para o comando da Câmara e do Senado.

Na época, a decisão travou a recondução do deputado Rodrigo Maia (sem partido-RJ) e do senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) à presidência das respectivas Casas Legislativas.

Logo após, partidos políticos recorreram à corte para reivindicar que tal entendimento fosse replicado nos estados.

O tribunal condenou as reconduções ilimitadas dos dirigentes de Assembleias, permitindo uma única reeleição, independentemente se na mesma legislatura ou não. Mas concluiu ainda que a vedação às sucessivas reeleições tem validade para as futuras legislaturas.

Integrantes de mesas diretoras reeleitos para o biênio 2021-2022 na maioria dos estados puderam, portanto, continuar a exercer suas funções.

​Mato Grosso e Roraima, porém, são exceções. Antes de o STF debater o mérito do tema, o ministro Alexandre de Moraes concedeu decisões liminares (provisórias) para afastar dos cargos os presidentes das duas Casas Legislativas e determinou que novas eleições fossem realizadas para a escolha dos substitutos.

As liminares de Moraes foram assinadas em janeiro (Roraima) e fevereiro (Mato Grosso) de 2021. Como seguem sem julgamento de mérito concluído, continuam a vigorar.

Os processos chegaram a entrar na pauta do plenário virtual, sistema em que os votos são inseridos por escrito, mas pedidos de vista (mais tempo para estudo) de Gilmar Mendes interromperam a análise. Não há data prevista para a retomada do debate, segundo informou o tribunal.

Reportagem da Folha mostrou no ano passado como os pedidos de vista afetam a conclusão de julgamentos importantes no tribunal

O plenário do tribunal somava até sexta-feira (7) 254 julgamentos interrompidos em razão dessa ferramenta.

Políticos afetados pelas liminares de Moraes alegam falta de isonomia constitucional. Dez presidentes de Assembleias estão no comando dos Legislativos por pelo menos três mandatos.

“Perdi a metade do meu mandato por força de uma decisão liminar, precária, de um ministro”, diz Jalser Reiner (Solidariedade), presidente afastado da Assembleia roraimense e que iniciava o quarto mandato seguido no posto.

“Qual a razão do tratamento diferenciado? Acaso as leis que valem para outros estados não valem para Roraima? É um dano irreparável, uma violência, não apenas contra mim, mas contra os eleitores de Roraima e meus pares.”

Patrocinada pelo PSOL, a ADI (ação direta de inconstitucionalidade) no caso de Roraima foi assinada pelo ex-ministro da Justiça e advogado José Eduardo Cardozo.

Eduardo Botelho (DEM) iniciava em Mato Grosso o terceiro biênio ininterrupto à frente da Assembleia quando foi afastado por Moraes, a pedido da Rede. Atualmente, com a realização de nova eleição em 2021, ele ocupa o posto de primeiro-secretário da Casa.

Havia até pouco tempo um entendimento no STF de que as normas sobre o Legislativo federal não eram de reprodução obrigatória pelos estados, com autonomia reconhecida para definir regras, inclusive autorizar as reconduções ilimitadas das mesas diretoras das Assembleias.

No Piauí, por exemplo, o deputado estadual Themístocles Filho (MDB) ocupa pela nona vez seguida o posto de presidente do Legislativo estadual.

A ação para tentar tirá-lo do cargo chegou ao Supremo em fevereiro de 2021 e foi distribuída ao ministro Kassio Nunes Marques, que é do Piauí.

Kassio não tomou qualquer decisão provisória no caso. Em setembro, mandou colher manifestações das partes interessadas na matéria, incluindo a PGR (Procuradoria-Geral da República) e a AGU (Advocacia-Geral da União). O processo não foi ainda a julgamento.

No caso de Roraima, a defesa de Reiner apresentou um recurso no início de dezembro para que a liminar que o afastou da presidência da Assembleia Legislativa fosse derrubada com base no que a corte decidiu sobre a matéria.

“O reclamante [Reiner] está afastado do cargo em virtude de decisão monocrática cujo entendimento foi superado por decisão plenária”, disse trecho do pedido assinado pelo advogado Bruno Rodrigues.

“Sendo certo que os mandatos têm prazo de duração, a sua subtração, dia a dia, minuto a minuto, significa tempo irrecuperável, cujo resultado é a usurpação de poder investido pelo processo democrático.”

Rodrigues fez referência a uma ADI relativa ao Espírito Santo julgada no plenário virtual em setembro. Na ocasião, outros processos sobre a matéria foram também analisados.

Por maioria, os ministros chancelaram o voto do ministro Gilmar Mendes para firmar o entendimento de que “a eleição dos membros das mesas das Assembleias Legislativas estaduais deve observar o limite de uma única reeleição ou recondução, limite cuja observância independe de os mandados consecutivos referirem-se à mesma legislatura”.

A regra, entendeu o tribunal, deve orientar a formação das mesas diretoras das Assembleias Legislativas que foram eleitas após a publicação do acórdão (resultado do julgamento) da ação que discutiu o caso federal. Esse acórdão foi publicado em abril. Portanto, em data posterior à escolha dos dirigentes dos legislativos estaduais.

O recurso do parlamentar foi distribuído ao ministro Luís Roberto Barroso. Procurado pela Folha, o gabinete do magistrado afirmou que ele analisará o caso a partir de fevereiro, com o retorno aos trabalhos após o recesso do Judiciário.

Marcelo Rocha/Folhapress

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