Eu também vou reclamar!

O ano é 1976 e o movimento da Música Popular Brasileira estava em alta no país com nomes como Belchior e suas canções de protesto, reclamando das dificuldades de ser um nordestino - ou melhor, apenas um rapaz latino-americano - vivendo no Brasil. Mas Raul Seixas, também nordestino, achava isso uma grande chatice e decidiu usar da ironia e do deboche para fazer “um protesto contra canções de protesto”. Se pra fazer sucesso tem que reclamar, então eu também vou, ora!

Foto: Divulgação

A personalidade forte e marcante - em outras palavras, um maluco beleza - do compositor e a sua parceria com Paulo Coelho foram um ponto chave para a criação dessa música. Numa época em que ainda nem existiam redes sociais, o Raulzito lançou aquela famosa indireta para todos os lados. Começando por Belchior, que àquela altura havia lançado o seu segundo disco intitulado “Alucinação”, disco que conta com a faixa “Apenas Um Rapaz Latino-Americano”. Nela, Belchior, originalmente vindo do Ceará, aborda como é a vida de alguém que saiu do interior sem dinheiro no banco e sem parentes importantes. Pois bem, Raul Seixas ironizou as linhas do compositor cearense e brincou dizendo: “Mas agora eu também resolvi dar uma queixadinha porque eu sou um rapaz latino-americano que também sabe se lamentar”.

Outro “alvo” para o deboche de Raul foi Silvio Brito, que lançou a música “Para o Mundo Que Eu Quero Descer”, também em 1976, e fez um sucesso considerável e por isso marcava presença nas programações das rádios nacionais. E claro que não ia passar batido para Raul Seixas, que escreveu: “Ligo o rádio e ouço um chato que me grita nos ouvidos pare o mundo que eu quero descer”.

Já o terceiro nome, Hermes Aquino, não fez necessariamente uma canção de protesto, mas também recebeu uma alfinetada na música baseada na interpretação que Raul Seixas e Paulo Coelho tiveram do título da faixa “Nuvem Passageira”. Contextualizando que toda essa história estava acontecendo durante o período da ditadura militar, para eles “Nuvem Passageira” era uma esperança de que aqueles dias em algum momento chegariam ao fim. A citação feita por Raul na canção foi: E sendo nuvem passageira não me leva nem à beira disso tudo que eu quero chegar.

Apesar das citações e alfinetadas, é importante lembrar que a composição de Raul e Paulo não passou de uma crítica com tons de bom humor e não tinha nada de pessoal. Ironicamente, “Eu Também Vou Reclamar” foi um sucesso. Será que o Raulzito nos revelou a fórmula? Isso eu não sei responder, mas se pra fazer sucesso tem que reclamar então, eu também vou!


Danilo Souza

Estudante de Jornalismo pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), músico e produtor audiovisual independente.

danilosouza.jornalismo@gmail.com (Email)
@danilosouza.jornalismo (Instagram)

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