"Se for rico o suficiente pode até..."

  • Laís Sousa

ilustração @ratanabanewsoficial

– Me diz aí, tem alguma coisa que o homem rico (ou que tenha parças fiéis, coniventes e ricos) não possa fazer?!

Mais uma semana difícil para ser mulher no Brasil e no (velho) mundo, porque, não satisfeitos em fazer merda aqui, nossos machos são exportados para vexame.

Numa espécie de substituição de um campo chamado prisão, sai Daniel Alves e entra Robinho, ambos condenados por crimes de estupro.

Um por crime coletivo, que covardemente em um time de 6 violentou 1 mulher embriagada, ousou desclassificar a penetração oral como transa e temer apenas que o caso “saísse na imprensa”. Outro, recém-casado e declaradamente apaixonado, traindo a mulher no banheiro de balada e negando até não conseguir mais. Um na Itália – estando por um bom tempo foragido de forma impune a ponto de participar de manifestações políticas e dar entrevistas em meio de comunicação (cristão) no Brasil. Outro que, até então, cumpria prisão preventiva em Barcelona. Um tentando deslegitimar a vítima questionando porque demorou a denunciar e depois da ocorrência foi em rolê com participantes do crime. Outro, com carta romântica sendo publicada pela (ex)esposa.

Estupro, vale lembrar, é o crime que o amigão Neymar escapou judicialmente num trâmite que, a meu ver, teve muito interesse envolvido, diga-se de passagem [vide caso Najila em Paris a convite]. Este que tinha tudo para ser referência no futebol mundial, registra em sua trágica carreira mais um episódio deprimente: é mais amigo que jogador caro, porque de forma familiar, paga o preço em euro para libertar um estuprador condenado. Nada que não esperasse, mas tanto para validar a cultura do estupro e de abusos diários que não perdoa criança, menina, adulta, idosa e nem mesmo morta…

[REVISANDO: Se a mulher está envolvida e, na hora do ato muda de ideia, se recusa e você insiste, é estupro! Se ela diz não às investidas e você a seduz levando-a ao ato sexual, é estupro! Se ela é ficante/namorada/esposa, diz que não está afim e você a obriga, é estupro! Se ela está bêbada, inconsciente ou incapaz de responder por si, o “sim” dela é um “NÃO”, e se mesmo depois desse “não” você continua, adivinha só… é estupro!]

Nesta semana, em que Samara Filippo compartilha experiência com violência patrimonial cometida pelo pai das suas filhas e Patrícia Ramos contou como suas finanças foram roubadas pelo ex, a prisão de Robinho é um “respiro” para a liberdade condicional do Daniel Alves que veio me pegar em um lugar delicado demais…

Milhares de coisas martelam minha cabeça&coração fazendo refletir um misto de pesar e ódio: a justiça, pra variar, acaba de se provar um tanto quanto injusta e ratificar que não importa a posição na escala de privilégios e avanços que tenha um país, o dinheiro compra qualquer coisa. Barcelona propaga para o mundo a mensagem de que, se for rico o suficiente, pode até estuprar. Então, talvez, o crime seja ser pobre! Mas o estupro é um crime facilmente impune no terceiro mundo também. Então, permitir liberdade condicional para estuprador fala sobre (des)valor. Sobre como a segurança e os corpos femininos têm preço. Se a vítima for lesada por cara que tem dinheiro, não terá justiça, então nem adianta se expor e denunciar… Assim, enquanto homens temem que mulheres os exponha, mulheres seguem com todos os motivos para temer que homens as violem e matem. É péssimo que esses casos envolvam homens negros, que numa escala social ocupam o desigual terceiro lugar, após homens e mulheres brancas, ficando acima apenas de mulheres negras que estão na base. Como esses homens aprenderam a (des)tratar as mulheres a partir da maioria preta que lhe rodeava? Eles, raras exceções a conquistar, por intermédio do dinheiro, privilégios que não teriam por conta da cor da pele, mas seguem psicologicamente adoecidos e adoecedores. Longa discussão que vale textos e mais livros…

Daniel Alves tinha tido cinco solicitações semelhantes negadas pela Justiça, que alegou risco de fuga, destruição de provas ou reincidência para impedir a liberdade do brasileiro. Em audiência via videoconferência, ele garantiu: “Não vou fugir. Confio na Justiça e estarei sempre à sua disposição”. As mulheres que fujam, porque na justiça parece que nós continuamos sem poder confiar, não é mesmo?!

Estou triste pela vítima, pelas tantas. Estou triste como mulher e indignada pelo fato de que ser mulher, numa sociedade governada por homens, é ter a confirmação diária que a gente não vale nada. Não tem segurança, não tem justiça, não tem respeito.

Então vale a luta, vale a boca no trombone e, para ironicamente terminar março, o mês da mulher, vale a prece pelo fim dos mitos, craques, galãs, comediantes e ídolos que gozam do $tatus irrestritos que lhe empoderam de absorção das suas responsabilidades: Que nós, por nós e todas as deusas, olhemos por nós e sejamos ouvidas por nós de um jeito que a justiça dos homens tarda e falha…


Laís Sousa

Jornalista-marketeira-publicitária comunicando em redes sociais de segunda a sexta. Escritora e viajante nas horas cheias e extras. Deusa, louca, feiticeira com trilha sonora em alta. Leitora, dançarina e pitaqueira por esporte sorte. Vamos fugir!
@laissousa_
laissousazn@gmail.com

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