Até eu sou mais conservadora que muita gente por aí
Capa do jornal O Estado de São Paulo de 9 de janeiro de 2023/Reprodução
Não sei vocês, mas eu me pego sempre problematizando alguma coisa. Às vezes comento sobre. Outras, não. Mas cá estou, volta e meia, refletindo a respeito de uma letra de música, por exemplo. A depender da canção, aplico o critério da licença poética, para justificar a falta de sentido.
Tenho pensado também nessa mania que algumas pessoas adquiriram de não pronunciar as palavras inteiras. É um tal de chamar nutricionista de “nutri” e dermatologista de “dermato”, por exemplo. É preguiça de falar? E “zap zap”, gente? Alguém achou que isso ficaria legal? Senhor, que agonia!
Pode até parecer chatice, mas me pergunto aonde vamos parar se normalizarmos certos modismos. E já que estamos no campo das expressões, que tal sairmos do incômodo para o perigo? Me explico: ultimamente, no Brasil, algumas palavras estão sendo cada vez mais utilizadas com seu sentido deturpado. Conservadorismo é uma delas.
Estão se autonomeando conservadores e, assim, estão sendo chamados por muitos, aqueles que não conservam as instituições. Aqueles que querem acabar com elas. Gosto muito do olhar do jornalista Reinaldo Azevedo sobre esse assunto. Concordo quando ele diz que em todas as sociedades democráticas há progressistas e conservadores, destacando que isso faz parte do jogo.
Há algum tempo assisti a um trecho do programa “Olha Aqui”, apresentado por ele e pela também jornalista Fabíola Cidral, no YouTube, no qual ele dizia que, em geral, o pensamento de esquerda é de inconformidade com as instituições, nos moldes em que elas operam, e propõe romper esse molde, criando, aprovando um outro. Enquanto o pensamento conservador diz que o molde é esse mesmo, que aí está, e que qualquer mudança deve ser feita dentro dele. Podemos dizer que por mais que existem divergências, progressistas e conservadores conseguem dialogar.
Porém, nos últimos anos, o país se enveredou por uma estrada perigosa. O diálogo foi perdendo espaço para a ignorância e para a violência. Foram propagadas tantas narrativas mentirosas e ideias confusas, além do constante estímulo a um golpe de Estado, que chegamos ao fatídico 8 de janeiro de 2023, quando, inconformados com o resultado da última eleição para presidente, pessoas que se diziam patriotas e, claro, conservadoras, invadiram e vandalizaram o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal (STF), uma semana após a posse do novo Presidente da República.
Sei que já faz mais de 1 ano, mas como disse, estou sempre matutando, cismando com algo. Como as ideias disruptivas não morreram e a confusão sobre o termo “conservador” permanece atual, aqui estou, mais uma vez, ponderando. Penso que se alguém deseja romper com a ordem, apenas para quebrá-la, não conserva nada. Portanto, conservador não pode ser. Gente que não suporta a democracia e quer a volta de um passado onde reinava a tirania não é conservadora. É reacionária.