Labirinto da Memória, do Dead Fish, é um disco para refletir e aprender sobre o passado
Falar que o Labirinto da Memória é um disco “novo” do Dead Fish seria exagero, já que foi lançado ainda em janeiro, mas a culpa foi minha que demorei para ouvir mesmo. Entretanto, de certa forma, falar sobre um álbum que remete às memórias que surgiram ao longo da vida do vocalista do grupo, Rodrigo Lima, faz com que o álbum não tenha uma data de validade definida e ainda dá tempo de aprender muita coisa.
Labirinto da Memória (2024), do Dead Fish.
O Dead Fish é uma banda que alguns consideram como hardcore e outros enquadram como punk. O que eu senti é que este disco é meio que uma mescla entre os dois estilos e até mesmo de alguns outros, o que é compreensível já que o grupo tem mais de trinta anos de atividade, passando por diversas formações durante esse tempo e acumulando mais referências sonoras. A formação atual, que foi responsável por gravar os discos mais recentes, conta com Igor Tsurumaki, no contrabaixo, Ric Mastria, na guitarra e também creditado como um dos produtores musicais do Labirinto da Memória, e Marcos Melloni, na bateria.
Apesar de ser uma banda formada por quatro integrantes, ao ler e ouvir as letras fica notável que o conceito do disco é mais centrado no Rodrigo e nas suas experiências, como a relação com o pai, na faixa “49”, as vivências de uma infância em meio à Ditadura Militar, na faixa “Avenida Maruípe”, e o amadurecimento pessoal, em “Dentes Amarelos”. Contudo, todos os membros cumprem bem as suas funções, construindo instrumentais interessantes e bem característicos.
Outro nome importante para a construção deste álbum é Alvaro Dutra, que aparece como compositor das letras, juntamente com Rodrigo, em nove das treze canções. A parceria já acontece desde o disco anterior, o Ponto Cego, de 2018, voltado para questões mais políticas e que foram abordadas de forma mais direta, visto o contexto da época após o impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, e a ascensão da direita através dos discursos de Jair Bolsonaro.
Escutei o Labirinto da Memória do início ao fim várias vezes durante o mês (o suficiente para fazer com que ele tenha garantido um lugar nas músicas mais tocadas do meu ano na retrospectiva do Spotify) e em cada uma delas parece ficar cada vez melhor. É óbvio que, sendo um disco do Dead Fish, temas como o combate contra as desigualdades sociais presentes em uma nação que ainda se encontra atrasada no tempo e presa em seus próprios labirintos também surgem de forma natural. É um disco que possui referências não só musicais, mas também literárias, segundo o próprio Rodrigo. “Queria fazer um álbum de memórias inspirado em 'Realismo Capitalista' e 'Meus Fantasmas', duas obras de Mark Fisher”, contou o vocalista, em entrevista para a revista Abril.
Para mim, interpretando como ouvinte, a mensagem foi bem recebida. Este não é mais um Dead Fish “jovem”, o que não é ruim, já que a experiência de estrada tornou o grupo mais maduro e com mais possibilidades de ver o mundo. É um disco que pode ser visto como pessoal, mas que também gera identificação nas pessoas, de certo modo, pelos seus temas. Talvez, se eu tivesse escutado este disco em janeiro, quando ele saiu, eu não teria conseguido entender tão bem como consegui agora, alguns meses depois - o que, ironicamente, acaba reforçando o conceito dele.
E, talvez, quando eu escutar daqui um ano, com novas memórias e experiências, ganhe ainda mais significado. Labirinto da Memória é um disco para refletir e aprender sobre o passado, permitindo perceber a evolução vivida pelo Rodrigo, enquanto eu lírico das canções, e, também, as evoluções das nossas próprias histórias.
Danilo Souza
Estudante de Jornalismo pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), músico e produtor audiovisual independente.danilosouza.jornalismo@gmail.com (Email)
@danilosouza.jornalismo (Instagram)