A Síndrome do Camarote e os Bastidores da Fama
Instagram/@esperanzaspalding/Reprodução
Milton Nascimento na arquibancada do Grammy e Bruna Marquezine "off" na fazenda Talismã. O que essas histórias têm em comum? Além de muito pano para manga nas redes sociais, elas escancaram uma lógica perversa: o que é bom no Brasil precisa de selo de aprovação gringo, e o que não tem post no Instagram pode nem ter acontecido.
Comecemos pelo mestre Milton, um dos maiores músicos que este país já pariu, sendo colocado em um canto qualquer enquanto mesas principais eram ocupadas por gente que, musicalmente, não serviria nem para abrir um show dele. A indignação deveria ser geral, claro. Mas a pergunta que fica é: o Brasil valoriza mesmo seus gigantes? Porque enquanto tem gente pagando R$ 1.500 para ver banda internacional tocar playback, artista brasileiro mal consegue vender ingresso de R$ 50 para show ao vivo. O problema não é só o Grammy, é a síndrome do camarote: só damos valor quando a fila tá grande e o ingresso custa caro.
Já Bruna Marquezine e Sasha foram para a festa que reuniu os próximos do João Guilherme na fazenda do pai dele, Leonardo, e não postaram uma mísera foto. A internet entrou em combustão porque elas não apareceram sorrindo ao lado de Virgínia Fonseca, cunhada do aniversariante e rainha do engajamento. Afinal, se você não posta, você não foi educada, ou grata, ou até nem ama o suficiente. Se você não posa ao lado de uma das maiores influenciadoras do país, é porque tem treta, é esnobe e desumilde, mesmo não sendo obrigada a nada e tendo uma carreira bem grandona, construída desde a infância que chegou lá fora.
O burburinho aumentou quando Bruna curtiu um post que elogiava o fato de ela "não negociar seus valores" independente de onde estivesse. O recado foi lido nas entrelinhas para bons (e raros) entendedores: existe uma diferença entre ser famosa e ser subcelebridade, entre ter uma carreira sólida e viver de engajamento, entre prezar por sua imagem e se associar a plataformas de jogos de azar.
João Figueiredo, marido de Sasha, foi assertivo ao dizer que quem não estava lá não pode opinar sobre a interação entre os convidados. Mas a internet, essa máquina de suposições, já tinha decretado: a ausência de posts vale mais que qualquer presença.
No fim das contas, Milton ficou na arquibancada de uma premiação que não reconhece nossa grandeza, enquanto o Brasil segue obcecado por quem posta ou não posta a vida acontecendo no off. O que fica da história? A constatação de que precisamos urgentemente aprender a dar valor ao que realmente importa – seja um artista que moldou a nossa música ou a integridade de quem escolhe onde pisa e com quem se associa. Mas aí, claro, sem foto, sem engajamento, sem trending topic. Quem vai ligar?

Laís Sousa
Jornalista-marketeira-publicitária comunicando em redes sociais de segunda a sexta. Escritora e viajante nas horas cheias e extras. Deusa, louca, feiticeira com trilha sonora em alta. Leitora, dançarina e pitaqueira por esporte sorte. Vamos fugir!@laissousa_
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