Grupo da sociedade civil tem reclamado de dificuldade para fazer doações aos waraos, desde que a Prefeitura passou a tutelá-los em abrigo

  • Por Fábio Agra
  • Atualizado: 29/08/2024, 07:18h

As doações de alimentos e itens básicos de higiene, além de material escolar e roupas, por um grupo que busca dar apoio aos indígenas waraos que estão em Vitória da Conquista, têm sido feitas através da superação de algumas barreiras, desde que a Prefeitura passou a controlar o acesso a um abrigo em que está essa população de deslocados forçados, segundo relatos que chegaram à Mega.

Desde que foram alojados em um prédio no povoado de Itapirema, as doações aos indígenas waraos passaram a ser feitas sob um agendamento prévio com a Prefeitura. Essa exigência pegou um grupo da Fundação Edivanda Maria Teixeira, membro da Rede Cáritas, de surpresa no último sábado (24). O local está sob o controle da Prefeitura de Vitória da Conquista, mas pertence ao Instituto Federal da Bahia (IFBA).

A Mega Rádio recebeu o relato dessa visita frustrada pelo grupo da Fundação Edivanda Maria Teixeira, que se dirigiu ao povoado de Itapirema para doar itens básicos de higiene, alimentos, brinquedos e material escolar, mas foram barrados por um porteiro e tiveram que fazer as doações em frente ao local que dá acesso ao abrigo.

“Planejamos minimamente a nossa manhã para levarmos estes itens a eles, mas também para levarmos um pouco de acolhida, afeto e amor, especialmente às crianças. Um único caráter da nossa visita era humanitário (…) Chegando lá fomos barrados no portão pelo segurança da Prefeitura, pois ele recebeu ordens para não deixar ninguém entrar”, diz o relato.

A Fundação Edivanda Maria Teixeira e a Rede Caritas vêm atuando em Vitória da Conquista para garantir que os direitos dos indígenas waraos sejam assegurados pelos poderes públicos, assim como têm arrecadado e feito doações a essa população. Essa foi a primeira vez que tiveram o acesso controlado e negado a um local em que estão os waraos.

“Questionamos ao vigia o porquê e ele só nos dizia que cumpria ordens: ninguém poderia entrar. Com a nossa insistência e indignação, ele decide ligar para sua superiora e explicar a situação para pedir autorização. Ela pede para falar comigo (representante do grupo) e argumenta que aquelas pessoas estão tuteladas pela Prefeitura e que a não permissão de entrada seria para a segurança e bem-estar dos refugiados, e que somente com autorização previa da Secretaria de Desenvolvimento Social era permitida a entrada”.


Carro em que estavam as doações parado em frente ao portão do abrigo. Foto: Fundação Edivanda Maria Teixeira

No local há cerca de 40 indígenas waraos. Eles estão nesse abrigo desde 12 de agosto. Eles foram levados para o local, no povoado de Itapirema, após uma reunião que aconteceu no último dia 8 de agosto entre a Promotoria de Justiça, a Prefeitura, representada pela Secretaria de Desenvolvimento Social, e a sociedade civil, representada pela Cáritas de Vitória da Conquista, além de representantes da Organização Internacional para Migração (OIM) e representantes do governo do Estado da Bahia.

Entre as deliberações acordadas nessa reunião, na qual Mega teve acesso à ata, ficaram assegurados aos indígenas waraos, através dos atendimentos da Assistência Social e de seus recursos, “o Bolsa Família, aluguel social, quando necessário, água, energia elétrica nos imóveis públicos, cestas básicas semanais”.

A situação dos indígenas waraos em Vitória da Conquista tem levantado discussões entre instituições e mobilização da sociedade civil devido ao estado de dificuldade para garantias dos seus direitos, como moradia, escola para as crianças e alimentação. No início do mês, a Mega Rádio fez uma reportagem especial sobre essa situação.

Leia aqui: Indígenas venezuelanos buscam refúgio e encontram vulnerabilidade e desafios em Vitória da Conquista

Sobre o acesso aos waraos que estão no povoado de Itapirema, em nota à Mega Rádio, a “Prefeitura de Vitória da Conquista, por meio da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social (Semdes), esclarece que não há restrições para recebimento de doações ou de visitas aos migrantes venezuelanos da etnia Warao, abrigados desde 12 de agosto, no povoado de Itapirema. No entanto, os migrantes se encontram alojados em um abrigo emergencial que segue regulamentação do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), por esse motivo é necessário seguir as normativas vigentes”.

Ainda na nota, a Prefeitura diz que dentre as normas está “a obrigatoriedade de agendamento prévio de visitas junto ao órgão gestor, com dias e horários específicos, respeitando a rotina interna e as atividades dos usuários (como refeições, atendimento médico, entre outros). Além disso, as visitas devem ser registradas e o acesso de pessoas externas ao abrigo precisa ser controlado, a fim de garantir a segurança dos acolhidos. Em alguns casos, principalmente em abrigos que atendem populações vulnerabilizadas, as visitas podem ser limitadas ou monitoradas, a fim de proteger os acolhidos de possíveis riscos”.

A Mega Rádio também entrou em contato com Instituto Federal da Bahia para saber como foi feita a concessão da área para abrigo e quais as prerrogativas da Prefeitura. Em nota, o IFBA informou que desconhecia que os indígenas waraos estivessem em local que pertence ao campus do IFBA, pois a área havia sido cedida à Prefeitura em setembro de 2023 a partir de um acordo de cooperação técnica para atendimento educacional às crianças do povoado.

“A Direção Geral do IFBA campus Vitória da Conquista desconhece a situação de indígenas waraos venezuelanos abrigados no prédio pertencente ao campus, uma vez que em setembro de 2023 foi firmado um acordo de cooperação técnica entre a instituição e a prefeitura municipal de Vitória da Conquista. Foi firmada uma cessão de posse do Centro de Vocação Tecnológica de Itapirema para a Secretaria Municipal de Educação (SMED) de Vitória da Conquista com a finalidade de utilização das instalações físicas do equipamento público, a título gratuito e temporário com o objetivo de atendimento ao acesso à educação de crianças do respectivo povoado. Estando, portanto, o espaço sob guarda e utilização da prefeitura municipal. Diante do contexto, o IFBA vai procurar a SMED para obter maiores esclarecimentos sobre o uso do equipamento cedido”.

Após a resposta do IFBA, a Mega questionou a Prefeitura no início da tarde desta quarta-feira, através da Secretaria de Comunicação, se o prédio em que estão os indígenas waraos é o Centro de Vocação Tecnológica de Itapirema cedido pelo IFBA para Secretaria Municipal de Educação e por que o prédio está sendo utilizado com outra finalidade. Em nota, a Prefeitura diz que “a utilização do prédio está sendo feita de forma emergencial e provisória para o acolhimento das famílias” e que a “Semdes trabalha na busca de alternativas para a realocação dos migrantes em outro local apropriado e definitivo”.

A Prefeitura também informa que o “prédio onde os migrantes se encontram foi usado para aulas dos alunos da Escola Municipal Raul Pompeia, enquanto a sede da unidade era reformada. Os alunos já retornaram para o espaço da Escola Municipal Raul Pompeia e estão estudando normalmente”.

Notas da Prefeitura à Mega na íntegra

Nota I

A Prefeitura de Vitória da Conquista, por meio da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social (Semdes), esclarece que não há restrições para recebimento de doações ou de visitas aos migrantes venezuelanos da etnia Warao, abrigados desde 12 de agosto, no povoado de Itapirema. No entanto, os migrantes se encontram alojados em um abrigo emergencial que segue regulamentação do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), por esse motivo é necessário seguir as normativas vigentes.

Dentre as quais, está a obrigatoriedade de agendamento prévio de visitas junto ao órgão gestor, com dias e horários específicos, respeitando a rotina interna e as atividades dos usuários (como refeições, atendimento médico, entre outros). Além disso, as visitas devem ser registradas e o acesso de pessoas externas ao abrigo precisa ser controlado, a fim de garantir a segurança dos acolhidos. Em alguns casos, principalmente em abrigos que atendem populações vulnerabilizadas, as visitas podem ser limitadas ou monitoradas, a fim de proteger os acolhidos de possíveis riscos.

Ainda de acordo com as normativas técnicas do MDS que regulam os abrigos emergenciais no Brasil, integradas à Política Nacional de Assistência Social (PNAS), os usuários de abrigos emergenciais têm direito à privacidade e à preservação de seus vínculos familiares e sociais, sendo incentivado o contato com familiares e amigos, desde que seja do interesse da pessoa acolhida e não comprometa a segurança dos acolhidos nem do abrigo. Essas normativas técnicas do MDS visam garantir a segurança, a privacidade e o bem-estar dos acolhidos, ao mesmo tempo que incentivam o fortalecimento dos vínculos familiares e sociais, em um ambiente seguro, sempre priorizando a proteção de direitos dos usuários.

Por fim, a Prefeitura informa que a população e/ou instituições interessadas em realizar visitas ou fazer doações podem fazer a articulação por meio do telefone (77) 3429-9407, de segunda a sexta-feira, das 8h às 18h.

Secom, 26 de agosto de 2024

Nota II

O prédio do Centro de Vocação Tecnológica de Itapirema, cedido pelo Instituto Federal da Bahia (IFBA) à Secretaria Municipal de Educação (Smed), é utilizado de forma emergencial e provisória para o acolhimento de nove famílias de migrantes venezuelanos da etnia Warao, totalizando 42 pessoas. Essa decisão foi tomada após diversas intervenções técnicas das secretarias municipais de Saúde (SMS), Desenvolvimento Social (Semdes) e Smed, diante da situação de vulnerabilidade em que esses migrantes se encontravam, sem moradia, após o proprietário solicitar a devolução da casa alugada em que residiam.

Diversos esforços foram empreendidos pelo Município na busca por um espaço adequado que comportasse a quantidade de migrantes e oferecesse estrutura apropriada, incluindo a tentativa de articulação com a rede estadual de educação.


Por isso, tornou-se necessário alocá-los em um ambiente que atendesse às suas necessidades básicas, garantindo a preservação de seus direitos, conforme estabelecido pela Lei Federal nº 13.445/2017. Destacamos que a Semdes trabalha na busca de alternativas para a realocação dos migrantes em outro local apropriado e definitivo.

O prédio onde os migrantes se encontram foi usado para aulas dos alunos da Escola Municipal Raul Pompeia, enquanto a sede da unidade era reformada. Os alunos já retornaram para o espaço da Escola Municipal Raul Pompeia e estão estudando normalmente.

Secom, 29 de agosto de 2024

Comentários


Instagram

Facebook